Dia 17
Pai
As coisas significam
mais do que aparentam. Para cada tapa na bunda existiu um empurrão no balança
de pneu. Para cada dia ausente existiu um afago no fim da noite. Para cada
despedida fria existiu uma chegada surpresa. Para cada noite de saudade existiu
uma manhã no parquinho da praça. A vida aparenta mais do que significa. Para
cada telefonema demorado existiu uma ausência na peça da escola. Para cada
curativo depois da queda existiu uma palavra dita na hora errada. Para cada
recado na escrivaninha existiu uma carta sem resposta. O amadurecimento exige
da gente mais do que os livros nos contam.
Mas não importavam as
quedas da bicicleta desde que você estivesse na calçada de casa me mandando
levantar. E não importava chegar tarde do trabalho porque eu sabia que você
passaria no meu quarto pra dar um beijo de boa noite. E não importavam os
ciúmes quando você dava “carinho especial” pra alguém porque eu me jogava no
chão pedindo atenção e você vinha correndo. Não importavam quantos telefonemas
você não atendia porque você sempre ligava de volta com mil histórias para se
desculpar e eu acreditava, mesmo sabendo que no fundo você só se esqueceu de
ligar. Não importava quantos presentes você trazia no meu aniversário porque
você nunca acertava o que eu queria e eu só queria você por mais meia hora. Não
importava pra mim se repreendido por ter tirado nota baixa em matemática porque
o que importava pra mim era que alguém se importava com o que eu fazia. Nunca
me importou você trabalhar demais nem ir embora cedo demais porque eu sabia que
você ia voltar.
No fim das coisas tudo
se resume em dois lados e a gente só tem que escolher um. Tudo na vida tem pelo
menos duas opções. Tudo na vida tem o lado bom e o lado ruim. Tudo pode ser
isso ou aquilo ou talvez até aquilo outro. Mas no fim, no fim de tudo, é a
gente quem escolhe o que vai seguir. Poderia ter escolhido o cara que se
esgotou trabalhando e se esqueceu de algumas datas importantes, o diretor
executivo de terno e gravata que não podia jogar bola naquele horário porque
tinha reunião na empresa, o homem que perdeu muito por ser obcecado por coisas
que no fundo nem tinham tanta importância assim. Mas eu pulei pro lado de lá.
Escolhi o cara legal que me ensinou a nadar e a cuspir à distância. O cara que
me ensinou a pagar o sorvete da menina que gostava e sempre respeitá-la antes
de tudo. Escolhi o herói, o superman,
homem de aço, o curador de todas as dores. Escolhi o homem que me ensinou a ser
homem e me orgulhou de ser homem. Escolhi o meu pai.
Feliz dia dos pais!
Muy bueno, Paulinha. Sempre bons os seus textos "diários" no diário.
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